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sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Liberdade e opções

Relativamente ao massacre em Newton, Connecticut nos Estados Unidos, e nesta questão específica das armas e da saúde mental, e evitando as reduções a categorizações unilaterais e nexos de causalidade simplistas, o que os Norte Americanos têm de perceber é que aqui está uma questão do preço que eles querem pagar para terem as suas liberdades.

Mais do que apontar o dedo à sociedade, a uma doença mental específica, ou até à política externa norte americana (no caso do Michael Moore no Bowling for Columbine) a cada massacre que acontece, é necessário ver isto como um caso de opções e estatística.

A defesa da Liberdade Religiosa e do direito a usar armas dado pela constituição norte americana é um direito tão fundamental para aquele povo que a sua inaliabilidade é tão ao mais fundamentalista que a nossa reivindicação sobre os nossos direitos adquiridos da saúde e da educação. De tal sorte que, a haver acontecimentos trágicos ou contradições que advêm das consequências diretas ou indiretas da aplicação desses direitos, a causa desses eventos é sempre exógena, quer ao povo quer à lei. O argumento habitual é “as armas não matam pessoas, são as pessoas que matam as pessoas”

Entra aqui a primeira questão: estatística.

Pessoas. As pessoas são uma massa disforme e sem cérebro. Uma pessoa é boa, duas pessoas são boas, uma massa disforme de inúmeras pessoas é o caos. E os norte-americanos são muitas pessoas. O problema é que toda a sua estrutura mental e consequente redação da constituição e das leis está virada não para a defesa das pessoas mas sim do indivíduo. Apesar da constituição definir o direito às pessoas usarem armas, a interpretação é que o direito é de cada um usar armas. O problema é que nos Estados unidos são cerca de 300.000.000 de "uns".

É portanto estatisticamente muito improvável que dentro desses 300.000.000 não exista um “um” que não seja mentalmente desequilibrado sou simplesmente ache que todos os que são diferentes dele devam morrer às mãos de uma gloriosa descarga de um clip de uma HK416. E se existe um, provavelmente existem umas boas dezenas de milhar, se não centenas, ou então, a dado momento da vida e em determinadas circunstâncias, cada um dos 300.000.000 de norte americanos.

Logo, se se distribui livremente armas a uma população que estatisticamente pode ter entre si não um assassino em massa em potência, mas centenas de milhares, é estatisticamente provável que volta e meia um desses tipos tenha acesso a uma arma e que descarregue tranquilamente o clip em cima de uma dezena de transeuntes, criancinhas ou não. As estatísticas normalmente, embora arbitrárias, têm razão. E as estatísticas dizem que os americanos matam-se uns aos outros por desporto e numa base regular.

Chegámos à segunda questão: opções.

Dizia no início que não queria ser simplista mas acabo por chegar a uma conclusão simplista. O principal problema dos norte americanos relativamente às armas tem somente a ver com o facto de não quererem, acima de tudo , que lhes tirem a liberdade de ter e usar uma arma. Isso para eles é fundamental. Mas a estatística diz que essa liberdade tem um preço. E é essa opção que têm que fazer. Manter a liberdade de cada um dos cidadãos norte-americanos em usar armas livremente tem o custo das mortes aleatórias numa base regular.

Se os atiradores estão doentes, são autistas, estão fartos dos colegas de trabalho ou achem que os seus concidadãos não merecem respirar o mesmo ar, é secundário, quando a eles - antes de tudo o que são ou possam vir a ser - ao abrir uma conta bancária lhes é oferecida uma caçadeira.

Podem optar em continuar a ter a sua AR-15. Mas por isso pessoas irão morrer.

É uma opção. Resta saber se sabem viver bem com ela.